Aplicativos como o Tinder fazem sucesso nos dias de hoje por facilitar relacionamentos e encontros românticos, mas não foram capazes de superar algumas barreiras, especialmente para pessoas com deficiência física. Muitas vezes, estas pessoas evitam convívio social ou se retraem nas relações pessoais com medo da reação do outro, em relação à deficiência física.
O que muitas pessoas não sabem é que existe toda uma classe de pessoas que sentem atração física por quem tem alguma limitação. O fetiche gerou até uma designação para essas pessoas: Devotee. (Leia abaixo o relato de alguém que se sente assim).
Pensando nisso, Ricardo Alonso Jorge criou o aplicativo Devotee, de mesmo nome, como uma espécie de “Tinder Alternativo” para pessoas com deficiência. “A ideia surgiu em minha separação, porque sou deficiente físico. Queria um aplicativo de relacionamento para deficientes físicos e não tinha, aí resolvi criar [o Devotee]”, contou Jorge em entrevista ao Estadão.
O app também é dedicado aos ‘devotees’, ou seja, quem se sente atraído(a) por indivíduos com deficiência física. O aplicativo, ainda incipiente, conta atualmente com 972 homens e 522 mulheres cadastrados. “Essas pessoas já deram 100.002 likes e 2.369 matches”, disse o criador e CEO do Devotee, com dados de 6 de junho.
O projeto estava em fase de testes desde maio de 2018, mas ganhou uma versão 2.0, ainda em junho, com algumas modificações para facilitar a experiência do usuário. “O aplicativo está crescendo cada vez mais”, garantiu Jorge.
A atualização do Devotee aconteceu na mesma semana da Feira Internacional de Tecnologias em Reabilitação, Inclusão e Acessibilidade, a Reatech, realizada entre 13 e 16 de junho, no São Paulo Expo, zona sul da capital paulista. Fomos representados no evento pelo trio: Juliana Caldas, Priscila Menucci e Paula Lima (Leia mais a respeito AQUI)
Conheça uma Devotee

“Tenho 22 anos, moro no interior de Minas Gerais e sou estudante de uma das melhores universidades federais do país (tenho certeza que por essa você não esperava). Quem passa por mim na rua, trabalha ou estuda comigo, nunca imaginaria esse fato sobre mim. Minhas primeiras memórias sobre isso têm início quando eu tinha por volta de cinco anos. Naquela época, tinha um rapaz com pólio que trabalhava em uma feira de artesanatos na minha cidade natal. Ele era o cara mais cool que eu conhecia, cabelo grande, vestia sempre camisas de banda de rock, ele sempre me chamava muito a atenção.
Após essa época, minhas próximas memórias são de quando eu tinha por volta de 12 anos. Assistia uma novela que tinha um personagem paraplégico. Na trama, ele se apaixonava pela filha do chefe dele, e ela por ele, mas no início, ela tinha medo de se envolver por ele por ele ser cadeirante. Eu desejava estar em uma situação semelhante a dela, porque eu nunca hesitaria. Enquanto minhas amigas estavam apaixonadas pelo vampiro do Crepúsculo, eu estava apaixonada pelo personagem cadeirante da novela (e claro, pelo vampiro também, era uma garota de 12 anos QUASE como todas as outras).
Perceber essa atração, trouxe um sentimento de angústia. Quando se é adolescente, ninguém quer se sentir diferente. Por mais que não tivesse feito nada errado, sabia que não poderia falar disso com minhas amigas, e que elas não eram como eu. Foi então que por meio de pesquisas na internet, descobri o termo devotee. Naquele momento, isso foi um alívio. Foi importante para mim saber que não era única, que tinha um nome para o que eu sentia, até aquele momento, acreditava ser a pessoa mais estranha e inadequada do mundo.
O alívio não durou muito, tudo o que existia na internet tratando desse tema era negativo. Termos como “perseguidores”, “anonimato”, “perigosos” são comuns. Eu não me identificava com isso e eu não queria ser assim. Existe um sentimento frequente por parte das pessoas com deficiência sobre os devotees “Como alguém ousa se sentir atraído por algo em mim que me trouxe tanto sofrimento?” Eu não ouso, eu não tenho opção, não tenho controle pelo que eu sinto, o que posso fazer e faço, é não fazer nada sobre essa atração. Nunca fiquei com um cadeirante e não o farei. A única vez em que conversei com um foi em um fórum de devotees e ele sabia quem eu era.
Para algumas pessoas, o devoteísmo se torna uma necessidade. Já li relatos de pessoas que só conseguem estar em uma relação com uma pessoa com deficiência. Não é o meu caso, tenho relacionamentos com pessoas sem deficiência, mesmo que minha preferência não seja essa. Não entendo como tudo isso funciona, as pessoas reagem a isso de maneiras diferentes, têm preferências distintas. Gostaria de saber mais sobre, talvez no futuro tenhamos mais respostas sobre tudo isso”.
O relato foi anônimo, enviado para o site Casa Adaptada e o app surgiu exatamente para conectar pessoas com sentimentos parecidos. O mais importante é quebrar o tabu sobre o sexo porque pessoas com deficiência ou sem sentem as mesmas necessidades. Nada mais natural, humano e belo. Estreitar os limites entre as pessoas, independente das diferenças físicas é outro diferencial oportuno que nos mostra como a tecnologia pode trabalhar a favor das pessoas.
com informações de Estadão, Época Negócios e Casa Adaptada.